De acordo com um grupo de estudiosos sobre os indígenas de Minas Gerais, estes seriam em sua grande maioria do grupo Jê também conhecidos como Tapuias - bárbaros em Tupi. As suas origens remontariam aos constantes cruzamentos entre os Caraíbas e os Tupis do litoral que buscaram refúgio nas áreas mais interioranas, estabelecendo migrações internas sempre em direção a Oeste evitando a Serra do Mar.1
De acordo com a análise sobre as aldeias Tupinambás, elas possuiriam um “território de domínio” formado por diferentes áreas específicas bem delimitadas - o tecoaba. Neste viveria um grupo com parentesco, alianças e interesses comuns. A aldeia seria, na realidade, o núcleo residencial do tecoaba e seria construída nas regiões mais elevadas de uma determinada ecozona com capacidade diversificada de recursos. As casas estariam dispostas em torno de uma praça central e circundada por paliçadas. Ainda protegidas por estas paliçadas poderiam encontrar também espaços para atividades específicas. Do lado de fora desta proteção estariam as áreas livres para pesca, coleta ou agricultura feita em clareiras abertas nas matas. Poderiam também estabelecer em áreas próximas, acampamentos de caça e de agricultura bem menores que o tecoaba.
Analisando uma série de mapas sobre quilombos mineiros feitos durante uma das expedições de Ignácio Correia de Pamplona2, percebemos o quanto esta definição do tecoaba se aproxima dos desenhos elaborados durante ou após a destruição das comunidades quilombolas.
Com relação aos mecanismos de defesa do tecoaba e dos quilombos, encontramos algumas proximidades. Ambos possuem sistemas artificiais. Em diferentes quilombos espalhados por todo o período colonial e mesmo durante o império, foram encontrados sistemas de defesa que tanto podem se remeter às práticas africanas como às indígenas. Além disso, todas as construções localizadas no interior de quilombos faziam parte de um espaço em comum e protegido, assim como o tecoaba. Mais uma vez utilizando o modelo do teocaba, pode-se identificar que do lado de fora da proteção do quilombo havia áreas voltadas para outras especializações, como por exemplo, roças plantadas com milho, mandioca, hortas e algodão. Além do que também estavam presentes as fontes de água e os matos, propiciadores de caça, pesca e coleta, complementando a alimentação.
Comparando o esquema do tecoaba apresentado por Assis e a série de mapas dos quilombos, podemos perceber as semelhanças. A principal é, sem dúvida, o fato de que tanto um quanto o outro está no interior de uma mata, circundado por ela. É ela que além de fornecer alimentação, serve de barreira e de esconderijo. A segunda semelhança é que as roças, ainda que estejam bastante próximas do núcleo residencial, estão separadas deste (a exceção é o quilombo da Samambaia). Seria uma separação do mundo onde se praticavam as relações sociais daquele destinado ao contato com a natureza e com a terra?
Seja como for, o fato é que comparando os desenhos dos quilombos e a descrição do tecoaba não se pode deixar de pensar nas proximidades espaciais e culturais entre ambos. Esta proximidade pode ser entendida como apenas uma apropriação por parte dos quilombolas de mecanismos funcionais à vida na floresta, como pode indicar também um possível contato cultural maior entre ambas as culturas.
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1. Oillan, José. Op. Cit. p. 11 e ss
2. Arquivo Conde Valadares. BN Manuscritos. 18,2,6
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