Ao olhar para o céu, neste instante vi a lua. Não há como não ser vista, diante de tanta formosura e beleza. O céu está claro, após a tempestade da tarde. Sinto o impulso de buscar Pablo Neruda. Abro ao léu, página 90.
Hoje, é hoje com o peso de todo o tempo ido,
com as asas de tudo o que será amanhã,
hoje é o Sul do mar, a velha idade da água
e a composição de um novo dia.
À tua boca elevada à luz ou à lua
se acresceram as pétalas de um dia consumido,
e ontem vem trotando por sua rua sombria
para que recordemos teu rosto que morreu.
Hoje, ontem e amanhã se comem caminhando,
consumimos um dia como uma vaca ardente,
nosso gado espera com seus dias contados,
mas em teu coração pôs sua farinha o tempo,
meu amor construiu um forno com barro de Temuco:
tu és o pão de cada dia para minha alma.
Comentários
RECORDARÁS aquela quebrada caprichosa
onde os aromas palpitantes subiram,
de quando em quando um pássaro vestido
com água e lentidão: traje de inverno.
Recordarás os dons da terra:
irascível fragrância, barro de ouro,
ervas do mato, loucas raízes,
sortílegos espinhos como espadas.
Recordarás o ramo que trouxeste,
ramo de sombra e água com silêncio,
ramo como uma pedra com espuma.
E aquela vez foi como nunca e sempre:
vamos ali onde não espera nada
e achamos tudo o que está esperando.