A construção da imagem do vadio era pautada no fato de que seriam um problema à sociedade. O vadio estava à margem e não tinha um espaço social próprio. Ele, em Minas Gerais do século XVIII, fazia parte de uma sociedade escravista, onde os papéis sociais eram muito claros. Havia os senhores e havia os escravos. À camada intermediária, cabia a adequação a um papel definido quase sempre em função do trabalho.
Entretanto, esta mesma sociedade desenvolveu a idéia de que o trabalho não era algo que devesse ser valorizado. O trabalho era relacionado às atividades dos escravos.
Logo, quem não era escravo, não trabalhava. Quem trabalhava se aproximava dos cativos, assim, a negação ao trabalho por parte do vadio não deixava de ser a negação de ser equiparado ao escravo, elemento tão baixo na sociedade. O vadio, qualquer que fosse a sua cor, era um homem livre. E livre, para esta sociedade, não exercia funções de escravos.
“... Não há na Capitania de Minas um homem branco, nem uma mulher branca, que queiram servir; porque se persuadem, que lhes fica mal um emprego, que eles entendem que só compete aos escravos. Deste modo centos de escravos e cento de escravas se ocupam nos serviços domésticos e deixam de se ocupar no trabalho das terras e na extração do ouro...”1
Estas idéias estavam presentes em toda a sociedade. O branco não aceitava o trabalho porque era branco, livre e, portanto, superior. Os mulatos, mulatas e negros e negras forros também não queriam trabalhar para não se reduzirem novamente às ocupações dos escravos2.
A sociedade se via numa encruzilhada: como induzir ao trabalho numa estrutura que não o valorizava enquanto atividade para todos os segmentos sociais? A solução evidentemente, passaria pela coerção e controle. Os escravos, teoricamente, não seriam problemas porque eram controlados – ou pelo menos deveriam ser – pelos seus próprios senhores. O vadio precisava de alguém que o controlasse e, para isso, houve sistematicamente, um processo de criminalização destes. 3
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1. Coelho, José João Teixeira. Instrucção para o governo da Capitania de Minas Geraes. (1780. In: RAPM. Ano VIII, fascículo I e II, Jan/jun 1903. p. 561
2 Sheila de Castro Faria analisando os registros paroquiais de Campos dos Goitacases, percebeu que as pessoas livres alforriadas movimentavam-se em maior número que as demais.Uma explicação para este fenômeno foi, sem dúvida, segundo a autora, o medo de uma possível reescravizaçãopor parte de seus antigos senhores ou de seus descendentes.
3 Fraga Filho, Walter. Mendigos, moleques e vadios na Bahia do século XIX. São Paulo: Hucitec, EDUFBA, 1996. Cap. 4280 APM SC- 130, fls. 55 e 56v.
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